Mutilação Genital Feminina (MGF): CULTURA OU CRIME?

No presente ensaio abordarei sobre a problemática questão da mutilação genital feminina (MGF), também conhecida, como circuncisão, excisão ou fanado. É o procedimento em que se remove total ou parcialmente os órgãos genitais femininos externos. Prática comum em grande parte do continente Africano, em alguns países do Oriente Médio, nalgumas partes da Ásia e América Latina e, é habitual na UE em certas comunidades originarias de países onde se prática a MGF. Procedimento, que muitas mulheres são obrigadas a passar em nome da tradição, da religião e da cultura. Porém acredito que, acima de tudo isso está o machismo, uma vez que estas meninas são obrigadas a passaram pelo processo de mutilação genital e, existem casos em que a menina é coagida para puder passar por esse processo, sem falar da pressão psicológica por parte da família. Se a família optar, por não mutilar a menina é tomada com forte repressão por parte da comunidade, pois a MGF para as sociedades que tem essa prática, além dos caracteres da tradição, ela está enraizada nas estruturas sociais, econômicas e políticas daquele países. Nalgumas, sociedades caso a menina não é mutilada ela é restringida de tomar parte em atividades e de realizar algumas tarefas dentro da comunidade, como se, ao fazer o processo de mutilação torna-se a mulher mais apta a fazer ou participar dessas atividades.

As mulheres, geralmente em idades avançadas, que cometem esse ato cruel contra as meninas, além de acreditar nas crenças da tradição e da cultura para a permanência dessa prática, têm medo de perder a única forma de ganhar dinheiro, uma vez que são pagas pelas famílias para fazer o processo de mutilação genital nas meninas. Ou seja, a prática de mutilação genital, também é uma prática com fins lucrativos. Os motivos dessa prática diverge conforme regiões, grupos étnicos ou comunidades. E, são diversos os motivos pelo qual se sustentam a prática da MGF. Segundo Amadiune, as culturas tradicionais africanas, praticam atos tidos como forma de controlar e preservar a mulher, ou seja, umas acreditam que ao fazer esse procedimento marca-se a passagem da menina para a vida adulta e posteriormente o casamento. Outras, tem a ver com a questão da higiene, pois acredita-se que a mulher se torna mais limpa após a prática. Em sociedades patriarcais é visto como a falsa representação do pênis, pondo em causa a virilidade masculina.

Na maioria das sociedades, a MGF é tida como um ato cultural. Mas daí cabe questionar, que cultura é essa que põe em risco a vida da mulher? Sim, é um risco!!! Porque essas mulheres, são obrigadas a passar por esse procedimento invasivo, doloroso e que causa danos por toda a vida. É inadmissível a perduração dessa prática, pois não traz nenhum benefício à saúde da mulher, pelo contrário só prejudica e deixa marcas profundas na vida dessas mulheres.

A organização mundial da saúde (OMS) classifica quatro tipos de MGF, o tipo I: a clitoridectomia, que é a remoção total ou parcial do clitóris ou da pele que o cobre; o tipo II: a excisão, que se baseia na remoção total do clitóris e dos pequenos lábios, com ou sem excisão dos grandes lábios; o tipo III: a infibulação, que é o estreitamento do orifício vaginal através da criação de uma membrana selante, pelo corte e aposição dos pequenos ou grandes lábios e o tipo IV: inclui todas as intervenções prejudiciais aos órgãos genitais femininos por razões não médicas, por exemplo a incisão, a escarefação, a cauterização, etc. Qualquer, que seja o tipo de mutilação pelo qual a menina sofreu terá consequências. Consequências essas que, podem ser de curto prazo, por exemplo: sangramento excessivo, dificuldades em urinar, infeções e, por vezes, a morte, ou de longo prazo: dor crónica, infeções pélvicas crónicas, desenvolvimento de quistos, abcesso e úlceras genitais, infeções no aparelho reprodutivo, diminuição do prazer sexual e as relações sexuais podem tornar-se dolorosas. As consequências para a saúde da mulher perdura ao longo da sua vida. Muitas vezes, o trauma se repeti na hora de dar à luz pois, as complicações obstétricas aumentam as chances de uma cesariana e, ou até hemorragia pós-parto. Ou seja, as consequências da prática causa danos que perdurarão ao longo da vida, danos esses muitas vezes difícil de reparar.

Segundo, a anistia internacional, a Somália é o país com maior índice dessa prática, sendo que 99% das somalis de 15 a 49 anos passaram pelo procedimento. A modelo somali, Waris Dirie tinha 5 anos quando foi mutilada, e hoje, ela luta para acabar com essa prática em todo mundo, visto que, por ano mais de três milhões de meninas passam pelo processo de mutilação genital. No ranking dos países que tem essa prática, Guiné Bissau, tem prevalência de 45%; Djibuti tem prevalência de 90% a 98%, ocupando o segundo lugar no ranking dos países com maior percentagem de mulheres mutiladas.

A MGF é, internacionalmente conhecida como violação grave dos direitos humanos de mulheres e meninas. Pois, põe em causa a integridade física e mental da mutilada; é um ato discriminatório de gênero, uma vez que quem sofre com a prática é o sexo feminino; viola os direitos das crianças, uma vez que a prática é feita na maioria das vezes quando a mulher ainda, se encontra na fase infantil; é um ato cruel de tortura, desumano e degradante que põe em risco a vida da mutilada. É necessário, dar um basta à prática!!!

É preciso urgentemente, rever as crenças que sustentam essa prática. Segundo Waldeck é necessário propor mudanças nos códigos legais de modo a coibir a circuncisão rotineira. Muitos defendem a permanência da prática de MGF, pois em nome da cultura eles se julgam capacitados de cometer tais crimes, sem compreender e entender que, a cultura não deve ser imutável, pelo contrário ela deve acompanhar as mudanças da sociedade e, principalmente ser refeita e repensada. Segundo Degrogi, a simples proibição legal da prática pode levar a um recrudescimento paradoxal e que o simples fato de constar em um código legal não significa que os governos vão efetivamente se empenhar na mudança de comportamentos socialmente arraigados. Ou seja, a simples proibição legal não significa que a prática deixe de existir, o governo pode e deve proibir a prática da MGF, porém é necessário um trabalho mais rigoroso para que a lei seja efetivada.

Enfim, as sociedades que tem a prática da mutilação genital, devem repensar, refazer e recriar outros meios de manter esta tradição. Encontrar meios de re-significar o conceito de MGF sem ter que colocar em risco a vida da mulher.

Dairine de Carvalho

 

Referências bibliográficas:

AMADIUNE, Ifi. Sexualidade, tradições religiões-culturais africanas e modernidade: expandindo a lente.

SQUINCA, Flávia; PALHARES, Dario. Os Desafios Éticos da Mutilação Genital Feminina e da Circuncisão Masculina.

OLIVEIRA, Filipa Andreia Vargos. Mutilação Genital Feminina: Cultura ou Crime? Lisboa, 2012

https://www.terra.com.br/noticias/mundo/naquele-momento-so-queria-morrer-conta-mulher-mutilada,4b55d1e5c8936410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html

Pesquisa feita em, 22 de Junho de 2017

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“Escolher escrever é rejeitar o silêncio”. Chimamanda Ngozi Adichie

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